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Acidentes de trabalho registrados nos últimos dez anos custaram ao país quase 23 mil mortes

Outra má notícia para o Brasil. Apesar dos inegáveis avanços na legislação e da crescente disponibilidade de equipamentos de segurança nas empresas (e a multiplicação de equipes especializadas nos serviços de prevenção), os acidentes de trabalho continuam a vicejar garbosamente no país.

Pior do que isso, o número de acidentes dá a impressão de estar agora em um viés de alta. A quantidade de acidentes cresceu assustadoramente no ano passado. De fato, em 2021, foram comunicados 571,8 mil acidentes e 2.487 óbitos associados ao trabalho, um impressionante aumento de 30% em relação a 2020.

A média anual de mortes registradas nos últimos dez anos foi inclusive superada em 2021. Entre 2012 e 2021, um total de 22.954 mortes no mercado de trabalho formal foram registradas no Brasil – quase 2,3 mil mortes por ano. Uma quantidade menor do que os quase 2,5 mil óbitos de 2021.

Sendo que é preciso ter em mente o considerável número de subnotificações ou a inexistência de quaisquer notificações sobre outros acidentes e mortes.

OBSERVATÓRIO – Esses dados são do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho, entidade criada e mantida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em cooperação com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), no âmbito da Iniciativa SmartLab de Trabalho Decente.

O órgão levantou outros dados igualmente inquietantes. Entre 2012 e 2021, foram registradas 6,2 milhões de Comunicações de Acidentes de Trabalho (CATs) e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) concedeu 2,5 milhões de benefícios previdenciários acidentários, incluindo auxílios-doença, aposentadorias por invalidez, pensões por morte e auxílios-acidente. No mesmo período, o gasto previdenciário ultrapassou os R$ 120 bilhões somente com despesas acidentárias.

O prejuízo não é apenas dos acidentados, dos familiares deles e da Previdência Social. As próprias empresas e a economia do país vêm sofrendo. O Observatório mostra também, por exemplo, que nesses dez anos foram perdidos, de forma acumulada, cerca de 469 milhões de dias de trabalho.

Calculado com a soma de todo o tempo individual em que os afastados não puderam trabalhar, o número de dias perdidos é uma das formas mais fáceis de medir, por aproximação, os prejuízos de produtividade para a economia.

Além dos prejuízos humanos e às famílias, os custos econômicos dessas ocorrências se manifestam em gastos do sistema de saúde e do seguro social e, no setor privado, em uma enorme redução da produtividade derivada de dias perdidos de trabalho acumulados.

Estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) apontam que essas ocorrências causam a perda aproximada de 4% do Produto Interno Bruto (PIB) global a cada ano. No caso do Brasil, esse percentual corresponde a aproximadamente R$ 350 bilhões anuais se considerado o PIB brasileiro de 2021, de R$ 8,7 trilhões.

Em dez anos, a perda econômica, sem contar as perdas familiares e os gastos do sistema previdenciário e de saúde, alcança R$ 3,5 trilhões, segundo esse critério. É como diz um velho ditado do mundo da previdência social: doenças e acidentes de trabalho afetam milhões, mas podem custar trilhões a um país.

COVID-19 – O Observatório também separou, no seu levantamento, os efeitos da covid-19 sobre os acidentes de trabalho ou equivalentes. Nos atípicos dois anos mais agudos da pandemia, 2020 e 2021, foram registradas 33 mil CATs e 163 mil afastamentos em razões de casos de covid.

Naturalmente, entre as ocupações mais frequentemente informadas nas comunicações estiveram os trabalhadores da área médica ou dos serviços de apoio: técnicos de enfermagem (35%); enfermeiros (12%); auxiliares de enfermagem (5%); faxineiros (3%) e auxiliares de escritório (3%).

Apenas quanto aos afastamentos, os tipos de ocupação foram mais variados. As ocupações mais atingidas no biênio foram a de faxineiros (5%), vendedores de comércio varejista (4%), alimentadores de linha de produção (4%), auxiliares de escritório em geral (3%) e motoristas de caminhão (3%).

Assim, se considerado o conjunto de ocupações e a totalidade de comunicações de acidentes de trabalho, os profissionais do setor de atendimento hospitalar representaram a maior quantidade de notificações em números absolutos e percentuais no biênio 2020-2021.

Na verdade, com a pandemia, os técnicos de enfermagem não apenas sofreram a maior quantidade de acidentes notificados em relação a outras ocupações, mas passaram de 6% do total no biênio 2018-2019 – ou 59.094 CATs -, para 9% do total, (72.326 CATs no biênio 2020-2021. Um aumento de 22%.

Como um todo, a participação da atividade de atendimento hospitalar no total de acidentes notificados cresceu de 11% no biênio 2018-2019 para 14% do total no biênio 2020-2021. Em números absolutos, o total de notificações de acidentes nesse setor cresceu 11% em relação ao biênio anterior, de 105.278 em 2018-2019 para 116.456 em 2020-2021.

Curiosamente, dentre outros setores que sofreram aumento no número total de acidentes notificados na comparação dos biênios, estiveram o de abate de suínos, aves e outros pequenos animais – de 21.185 acidentes em 2018-2019 para 22.443 em 2020-2021-uma elevação de 6%.

LESÕES GRAVES – Ainda de acordo com o Observatório, no total, o número de benefícios acidentários concedidos pelo INSS voltou a disparar em 2021, com crescimento de 212% – de 72.367 em 2020 para 153.333 em 2021. O número, de qualquer forma, ficou ainda abaixo do registrado em 2019, ano anterior à pandemia (195.841).

Destacaram-se – como sempre – os afastamentos previdenciários acidentários por lesões graves, como fraturas, amputações, ferimentos, traumatismos e luxações, cujo número saltou de 40.117 em 2020 para 93.820 em 2021, um espantoso aumento de 234%.

Quanto ao adoecimento no trabalho, o número de afastamentos causados por doenças osteomusculares e do tecido conjuntivo, inclusive LER-Dort, sofreu um aumento de 192%, de 16.211 para 31.167 casos.

Já o total de auxílios-doença concedidos por depressão, ansiedade, estresse e outros transtornos mentais e comportamentais (acidentários e não-acidentários) se mantiveram em níveis elevados, na média de concessões dos últimos cinco anos anteriores à pandemia da covid-19, com cerca de 200 mil concessões.

As máquinas e equipamentos industriais continuam a se destacar como principais agentes causadores de mortes e afastamentos devido a acidentes. Na série histórica de dez anos (2012 a 2021), grande parte dos acidentes foi causada pela operação de máquinas e equipamentos (15%). Em 2021, esse percentual se manteve elevado, em 16% do total.

E como em anos anteriores, acidentes ocupacionais envolvendo máquinas e equipamentos resultaram em amputações e outras lesões gravíssimas com uma frequência 15 vezes maior do que as demais causas, gerando três vezes mais acidentes fatais que a média geral.

A construção civil é também um segmento da economia no qual a quantidade de acidentes sempre foi expressiva, com uma parte deles sendo acompanhada de mortes. Uma divisão que apresentou inesperado crescimento em 2021 no número de acidentes no setor, com 74 casos, foi o comércio varejista de ferragens, madeira e materiais de construção. No ano anterior, esse total foi de 45.

Até as notificações de acidentes de trabalho grave envolvendo crianças e adolescentes vem crescendo, totalizando 32,5 mil desde 2007. Em 2021, dados preliminares apontam crescimento do número dessas notificações para as faixas etárias de 5 a 13 (aumento de 19%, de 88 para 105 casos notificados) e de 14 a 17 anos (aumento de 46%, de 1571 para 2295 casos).

Em 2021, os maiores aumentos no número de notificações de acidentes ocorreram em Roraima (53%), em Santa Catarina (35%) e no Piauí (29,9%). No caso da concessão de benefícios, o maior crescimento no número de afastamentos foi registrado no Tocantins (173%), em Goiás (166%) e no Amapá (153%).

Quanto aos municípios com mais de 100 acidentes notificados, destaca-se a cidade de Cafelândia (PR) – aumento de 249% no número de notificações -, seguida por Tangará da Serra (MT), com 137%, e Brusque (SC), com 122%.      (Alberto Mawakdiye)

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