Vendas de máquinas agrícolas devem fechar 2020 em patamar próximo ao de 2019
Pelo visto, nem a pandemia do novo coronavírus está conseguindo abalar os alicerces do agronegócio brasileiro, inclusive do seu setor tecnologicamente mais dinâmico, o de máquinas e equipamentos voltados para as tarefas do campo.
De acordo com Pedro Estevão Bastos, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas (CSMIA) da Abimaq, o faturamento das empresas associadas cresceu 6,5% no primeiro trimestre de 2020, refletindo o crescimento geral da agropecuária, que se mostrou 1,9% maior na comparação com o observado nos três últimos meses de 2019.
“É verdade que em abril e maio as vendas caíram em torno de 10%, mas no acumulado do ano o faturamento também ficou positivo, em 2%”, diz Bastos. “A perspectiva para meados de 2020 também é de queda, devido ao esgotamento dos recursos do Moderfrota, a principal linha de financiamento de máquinas agrícolas. Mas, para o segundo semestre, esperamos que o cenário seja absolutamente normal para o setor”.
Em resumo: para o executivo, não havendo grandes surpresas, o ano de 2020 deve fechar bem próximo da estabilidade, com pequenas variações de queda ou de crescimento. Muito diferente do que deve acontecer com a maioria dos segmentos industriais do país, nos quais pelo menos algum prejuízo é mais do que certo.
SAFRAS RECORDES – O agronegócio, de fato, foi o único macrossetor da economia que teve resultado positivo no Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre. O valor gerado pelo campo foi de R$ 120 bilhões e, até o fim do ano, com a expectativa de safras recordes em diversas culturas, deve alcançar R$ 697 bilhões.
Para muitos especialistas, o agronegócio pode inclusive ajudar a atenuar o tombo da economia brasileira, devendo até mesmo ser o motor da recuperação, quando ela começar após a pandemia – que se espera estar totalmente controlada apenas em 2021.
“O Brasil tem tudo para mostrar ainda mais a sua força neste momento, em que a maior parte dos países produtores amarga perdas significativas”, diz a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Teresa Cristina Corrêa. “Encontramos o caminho para dar segurança ao produtor sem parar a produção, o que muitos outros países não conseguiram.”
NÚMEROS EXPRESSIVOS – Hoje, não há como negar que o Brasil se tornou uma superpotência agropecuária. O volume total de alimentos produzidos no país é capaz de sustentar 1,5 bilhão de pessoas, ou sete vezes a população brasileira. Nos últimos dez anos, a oferta total do setor cresceu 68%.
Carro-chefe da agricultura, a produção de soja, por exemplo, deve chegar a 121 milhões de t neste ano, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), alta de 6,7% na comparação com a última safra.
“Também tivemos um pouco de sorte”, reconhece o diretor-administrativo da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) do Mato Grosso, Lucas Costa Beber. “A questão do coronavírus para nós foi praticamente irrelevante porque, quando o surto chegou ao Brasil, a nossa safra já estava colhida.”
No cômputo geral, a safra de grãos deste ano é estimada em 250 milhões de t, um volume recorde, com a liderança da soja, mas também graças ao aumento de culturas como a do arroz. O país hoje também é muito forte em lavouras como a do milho e do algodão.
Naturalmente, há segmentos mais diretamente afetados pela pandemia, como floricultura, frutas e hortaliças, que dependem do mercado de eventos e do de bares e restaurantes, ainda praticamente fechados. Também houve perdas na aquicultura: só a comercialização de camarão teve queda de 80% nesta primeira parte do ano.
MERCADOS ÁVIDOS – As exportações também vêm crescendo. No último decênio, as exportações tiveram uma evolução de 87%, tornando o Brasil um dos principais players nessa área, hoje atrás apenas dos Estados Unidos e da Europa em vendas globais.
No mercado externo, o setor agropecuário gerou ganhos de US$ 6,7 bilhões para a balança comercial entre janeiro e abril deste ano, movimentando US$ 18,3 bilhões em embarques para o exterior e US$ 11,6 milhões em importações.
A alta nas vendas externas foi de 17,5% diante de igual período do ano passado. A participação do agro nas exportações totais subiu de 18,7% para 22,9% no quadrimestre.
Ainda melhor, neste ano, houve um aumento de 15% na oferta de produtos destinados à exportação e a abertura de pelo menos 20 novos mercados no exterior. Segunda maior cultura em volume do setor, o milho, por exemplo, deve passar de 100 milhões de t, outro recorde. O milho brasileiro é o cereal que está sendo mais demandado pelo mercado internacional.
“E pela segunda vez o produto do Brasil superou o dos Estados Unidos em volume de exportações, com 37 milhões de toneladas embarcadas, contra 35 milhões dos americanos”, diz Alysson Paolinelli, diretor da Associação Brasileira dos Produtores do Milho (Abramilho).
DEMANDA POR MÁQUINAS – Este bom desempenho refletiu-se, obviamente, na indústria de máquinas agrícolas, principalmente no varejo, mas também no atacado, que deverá ter somente uma pequena queda nas vendas este ano, contrariando as expectativas mais pessimistas no começo da pandemia.
De acordo com Rafael Miotto, vice-presidente da New Holland Agriculture, o atacado também já vive um período de aquecimento e deve fechar com desempenho de 5% a 10% abaixo de 2019. “O que está ótimo, neste ano de pandemia”, diz.
O balanço de maio do segmento de máquinas agrícolas e rodoviárias referente ao último mês de maio, divulgado pela Associação Nacional dos Veículos Automotores (Anfavea), mostrou que as vendas de máquinas agrícolas no mercado interno atingiram 3,9 mil unidades, alta de 23,3% na comparação com maio do ano passado e de 61% na comparação com abril. De janeiro a maio, as vendas totalizaram 15,7 mil unidades, alta de 0,9% sobre igual período de 2019.
As exportações, no entanto, caíram: 39,4%, na comparação entre os meses de maio de 2020 e de 2019 e, no acumulado do ano, a queda foi de 31,1%. Esses números refletiram na produção do setor, também afetada pela paralisação das atividades nos meses de março e abril, que registra desempenho abaixo do verificado no ano anterior: – 29,5% no que se refere a maio e de – 22,5% no acumulado do ano.
PLANO SAFRA – Para Alfredo Miguel Neto, vice-presidente da Anfavea – Máquinas Agrícolas e Rodoviárias, de qualquer modo, as projeções para 2020 acabarão por depender do Plano Safra, cuja nova versão 2020/2021 foi apresentada pelo governo federal no mês de junho.
“Nossas novas projeções serão feitas com base no plano, não só quando às condições de financiamento e volume financiado, mas também a quando estará efetivamente operacional”, explica o executivo.
Os valores e taxas de financiamento não chegaram, aliás, a entusiasmar muito a indústria, mas não foram de todo decepcionantes, tendo em vista o quadro atual, no qual o Tesouro Nacional vem sofrendo dificuldades orçamentárias por conta dos gastos inesperados que estão sendo feitos devido à Covid-19.
O plano deste biênio irá contar com R$ 236,3 bilhões de recursos para crédito rural, aumento de R$ 13,5 bilhões sobre o montante do plano anterior. Desse total, para o financiamento de máquinas e equipamentos, serão destinados R$ 11,8 bilhões, sendo R$ 9 bilhões para o Moderfrota e R$ 2,8 bilhões no Pronaf Mais Alimentos.
A taxa de juros do Moderfrota caiu 1 ponto percentual em comparação ao plano anterior, de 8,5% para 7,5%. Os financiamentos poderão ser contratados de 1.o de julho de 2020 a 30 de junho de 2021.
GRANDES DE FORA – Mas certa “seletividade” nos financiamento vem sendo observada pelos fabricantes, e os desagradando. Segundo a Abimaq, nos últimos 12 meses o segmento teve vendas da ordem de R$ 30 bilhões, mas cerca de 4 milhões de agricultores não conseguiram ter acesso ao financiamento federal e teve de financiar as máquinas a juros de mercado, bem mais altos.
Ficaram de fora principalmente grandes agricultores, muitos dos quais tiveram de adiar a compra de máquinas para um período melhor em termos de financiamento público, prejudicando por tabela as indústrias do setor de máquinas. (Alberto Mawakdiye)