30% dos brasileiros acham aceitável espionar a (o) parceira (o)
Um em cada 10 brasileiros já ouviu de seu parceiro (a) o pedido para instalar um programa de monitoramento, aponta a pesquisa “Stalking online em relacionamentos” da Kaspersky. Infelizmente, o estudo mostra que esse dado não indica um cenário positivo, pois uma parcela importante dos entrevistados (30%) acredita que é justificável realizar o monitoramento sem o consentimento da pessoa.
O mais preocupante é que 14% dos brasileiros simplesmente acham normal fazer o rastreamento, enquanto 16% acreditam que ele é justificado apenas em certas circunstâncias (resultando no total de 30% que aceitam). Entre as motivações usadas para explicar essa atitude está uma possível infidelidade (67%), questões de segurança (54%) e uma suspeita de atividade criminosa do parceiro.
“Casos graves de violência doméstica podem afetar a saúde mental da vítima, como também pode ter relação com algum distúrbio psicológico ou emocional no abusador, a exemplo de comportamentos patológicos que levam a obsessão, intolerância a frustrações e perseguição de pessoas. É importante entender isso como uma realidade vivenciada por milhares de pessoas, sendo comum a negação de um comportamento coercitivo (forçado) e/ou abusivo vindo de alguém muito próximo do seu relacionamento íntimo”, afirma Milena Lima, delegada de polícia com atuação especializada em crimes digitais e violência contra mulheres.
A especialista diz ainda que é muito comum o (a) abusador (a) disfarçar sua verdadeira intenção explicando a necessidade do monitoramento por questões de segurança ou prova de confiança. “Essa falsa justificativa é usada persuadir vítimas do crime de stalking, sendo preocupante o número de pessoas que acabam se sujeitando ao controle por desconhecer seus direitos e até mesmo por não se enxergarem como vítima de abuso”, continua Milena.
O que diferencia o crime e uma relação saudável que usa um programa de monitoramento é o consentimento. A pesquisa da Kaspersky abordou esse cenário e revelou que 23% das pessoas no Brasil aceitariam o monitoramento em determinadas condições: 11% para segurança e 12% caso ele fosse mútuo. Porém, quase 4 em 10 brasileiros pensam que uma relação deve ser totalmente transparente.
“As descobertas deste estudo destacam a existência de uma ideia romantizada do que é o amor. Isso é particularmente mais presente entre os mais jovens, no qual um parceiro não tem direito à privacidade e devem compartilhar tudo um com o outro como forma de demonstrar seu amor e confiança. É importante dizer que essa ideia é um mito e representa um perigo real às pessoas”, destaca Milena.
Para a presidente da Associação Artemis (que atua na prevenção e erradicação de todas as formas de violência contra as mulheres) e doutora em Saúde Coletiva pela Universidade de São Paulo, Raquel Marques, o mais surpreendente foi verificar que a quantidade de pessoas no Brasil (26%) que suspeitam que seus parceiros os espionam com um programa instalado no celular é maior que a quantidade que acha aceitável fazer o monitoramento sem consentimento.
“Podemos concluir que talvez todas as pessoas que suspeitam de espionagem em seu relacionamentos estão corretos. Isso é assustador e mostra como o tema precisa ser encarado com seriedade. Eu ainda vou além quando o tema é consentimento. Fora a situação na qual o indivíduo tenha ciência do rastreamento e que possa cancelá-lo a qualquer momento, os demais casos são de abuso. Mesmo que haja ciência, ela pode ter sido aceita em uma contexto de coação física ou psicológica e isso configura uma violência íntima”, afirma Raquel.
A pesquisa “Stalking online em relacionamentos” foi realizada a pedido da Kaspersky pela empresa de pesquisa Sapio de forma online em setembro de 2021 e abrangeu um universo de 21 mil participantes de 21 países, incluindo o Brasil. A motivação da empresa na realização deste estudo e sua posterior divulgação também está relacionada com o segundo aniversário da Coalizão Contra o Stalkerware – entidade que visa combater esta ameaça digital na qual a Kaspersky é cofundadora.