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Com desempenho ruim no ranking ambiental, Brasil pode afastar investimento estrangeiro

Um estudo recente efetuado junto de 19 países emergentes pela consultoria empresarial MB Associados, uma das maiores e mais bem equipadas do país, deve estar deixando de cabelo em pé os eventuais empresários estrangeiros interessados em investir no Brasil.

No ranking elaborado pela consultoria, que se baseou em indicadores econômicos, sociais e ambientais, o Brasil ficou nada menos do que na terceira pior posição, com uma pontuação de 60%.

Por este ranking, quanto mais próximo de 100%, pior. O Brasil só apresentou desempenho melhor que do que as Filipinas e a África do Sul. A Coreia do Sul, com 2%, e o Chile, com 24%, ficaram no topo da tabela.

Uma possível desistência de empresários principalmente europeus em aportar no Brasil diante desses dados seria, inclusive, bastante compreensível.

Principalmente na Europa – mas em menor escala também nos Estados Unidos e Japão, embora quase nada na China – as grandes empresas, premidas por mercados internos cada vez mais conscientes, são praticamente obrigadas, hoje, a se preocuparem com indicadores que vão além de emprego e inflação, ou seja, que incluam ainda resultados sociais, ambientais e de governança.

São quesitos nos quais o Brasil está muito mal. Nos critérios sociais e de governança, por exemplo, o Brasil aparece com assustadores 71% e 72%, pontuação mais do que 10% maior do que a média geral de 60% aplicada ao país.

Mesmo no cumprimento das regras ambientais, no qual o Brasil aparece bem melhor, com 39%, a MB faz questão de observar que se trata de algo que não deverá perdurar nem a curto prazo.

“É fato mundialmente reconhecido que a gestão do presidente Jair Bolsonaro tem sido muito precária no manejo da questão ambiental”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. “É muito provável que a posição do país piore também neste quesito no ano que vem”.

 

ÍNDICE DE GINI – A importância dada atualmente pelas empresas a questões sociais e ambientais pode ser comprovada pelo fato de que foi a primeira vez que a própria MB fez uma lista desse tipo usando critérios ESG (Meio Ambiente, Social e Governança, na sigla em inglês), e trabalhando com critérios ambientais estabelecidos pela prestigiosa Universidade Yale, dos Estados Unidos.

Também empregou de forma inédita o Índice de Gini (medidor de desigualdade) e os dados do Banco Mundial para mapear indicadores de governança, como estabilidade política, eficiência do governo nas mais diferentes áreas e controle da corrupção.

Fatores conjunturais também foram analisados, como a reação dos países à pandemia da Covid-19. Como era previsível, os indicadores de desigualdade cresceram no Brasil durante a pandemia.

Sérgio Vale adverte que, além de afugentar possíveis investidores estrangeiros, os indicadores ruins do país tanto no que diz respeito à economia quanto à sociedade e ao meio ambiente, podem ser usados, inclusive, para reverter acordos comerciais importantes para o país.

De fato, o acordo entre o Mercosul, bloco econômico sul-americano do qual o Brasil faz parte, e a União Europeia, já faz algum tempo vem correndo riscos. Muitos legisladores europeus e integrantes dos governos do continente não hesitam mais em classificar o Brasil como “um espantalho” em questões ambientais, e na prática suspenderam o fechamento do acordo à espera de compromissos ambientais mais sólidos do país,

Isto não quer dizer, é claro, que os outros 18 países da lista da MB Associados não tenham problemas. Têm, e muitos. Nos outros países dos Brics (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), por exemplo, há sérios problemas de desigualdade de renda (África do Sul), ambientais (Índia) e governança (Rússia).

Já a China – um dos países que mais investem no exterior – praticamente empata com os brasileiros no ranking, com 60%, tendo a governança (devido ao sistema de governo autoritário) e a questão ambiental como pontos fracos. A diferença, contudo, está na força distributiva muito maior da economia chinesa.

De qualquer forma, a economia brasileira deve fechar 2021 com um desempenho um pouco melhor do que no ano passado. A estimativa para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil este ano é de 2,6%, após uma queda de -4,1% em 2020. No entanto, a projeção da taxa de desemprego para este ano é de 14,7%, alta de 2,2 pontos ante 2020. Por seu turno, a expectativa para a dívida pública bruta em percentual do PIB é de 88,6%, volume considerado alto.

        

QUESTÃO AMBIENTAL – Prova de que as mazelas sociais tendem a absorver a questão ambiental para o seu arcabouço está em que até o principal indicador da Organização das Nações Unidas (ONU) para medir o nível de vida das pessoas no planeta, o célebre Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH, ter acabado de ganhar um “P”, para levar em conta o impacto ambiental em cada sociedade. O IDH passou a ser IDHP, ou Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado às Pressões Planetárias.

O IDH foi criado nos anos 1990 para substituir o PIB per capita como medida de qualidade  de vida, dado que o PIB mede apenas a riqueza, e de um ponto de vista algo abstrato, posto ser fruto de um fracionamento estatístico. O IDH une à renda os indicadores de educação e saúde.

Com isso, a ONU eliminou uma séria distorção, que era de o PIB per capita poder até expressar a riqueza de um país, mas não mostrar se ela beneficiaria o povo em termos de escolaridade e expectativa de vida.

Com a inclusão do “P”, a análise vai se tornar mais abrangente e, ao mesmo tempo, mais rica em detalhes. Curiosamente, houve mudanças para lá de inesperadas no ranking com a inclusão do impacto ambiental na medição do IDH.

A Noruega, por exemplo, de líder inconteste, caiu nada menos do que 15 posições – agora é a 16ª. Isto porque o inegável bem-estar social de sua população depende um pouco demais da riqueza do petróleo que ela explora no mar – o que faz da Noruega uma exportadora e terceirizadora de danos ambientais, embora tenha uma “agenda verde” que sem dúvida põe em prática no país e no exterior.

Os Estados Unidos também se deram mal. Os EUA estavam em 17° lugar no IDH, mas despencaram chocantes 45 posições no IDHP, estando agora no 62º lugar. Os americanos são os maiores estimuladores mundial do efeito estufa.

O curioso é que o Brasil saiu ganhando com o acréscimo do “P” ao IDH. Subiu 10 lugares, chegando à 74ª.  posição. Ou seja, se estava57 posições abaixo dos Estados Unidos, agora está apenas 12, o que não deixa de ser um consolo.

 

QUEIMADAS – O que explica o fato de o Brasil ter subido no ranking do IDHP e os EUA caído é um segredo de polichinelo: o CO2 enviado à atmosfera pelos brasileiros têm origem mais nas queimadas e desmatamentos, e na poluição provocada pelas emissões dos automóveis, do que na indústria, que produz volume maior.

De fato, um estudo do instituto de pesquisas Climate Accountability Institute, com sede nos Estados Unidos, mostrou que um grupo de 20 empresas é responsável por mais de um terço das emissões de gases causadores do efeito estufa em todo o mundo desde 1965. A única empresa brasileira que aparece na lista é a petroleira estatal Petrobras, e mesmo assim na 20ª. posição.

Segundo o estudo, estas 20 empresas – todas produtoras de petróleo, gás natural ou carvão – foram responsáveis por 480,16 bilhões de t de dióxido de carbono e metano liberados na atmosfera nesse período.O montante representa 35% das emissões totais de combustíveis fósseis e cimento, que foram de 1,35 trilhão de toneladas.

O cálculo foi feito baseado na produção anual de petróleo, gás natural e carvão relatada  por cada empresa, e leva em conta as emissões desde a extração até o uso final do combustível.

A lista tem 12 empresas estatais e 8 privadas e é encabeçada pela estatal saudita Saudi Aramco, responsável pela emissão de 59,26 bilhões de t de dióxido de carbono, o equivalente a 4,38% do total mundial no período analisado.

Em seguida aparecem a americana Chevron, com 3,20% do total, e a russa Gazprom, com 3,19%. A Petrobras responde por 8,68 bilhões de t de carbono equivalente, o que representa 0,64% do total. (Alberto Mawakdiye)

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