Brasil avança no uso da bicicleta como meio de transporte
Devagar e sempre, o Brasil está avançando no uso da bicicleta como meio de transporte. Estima-se que o Brasil já tenha 70 milhões de ciclistas, o que representa cerca de um terço da população do país – com pouco menos da metade deles usando bikes para ir ao trabalho ou à escola, prática mais tradicional nas classes populares.
Para atender essa multidão de ciclistas, a malha cicloviária foi aumentada em 133% em quatro anos nas capitais brasileiras. Só na cidade de São Paulo, a maior do país, já há quase 500 km de ciclovias.
As bicicletas e as ciclovias não estão contribuindo apenas para a retirada de milhares de automóveis das ruas e para reduzir a poluição. Segundo pesquisa da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) realizada na zona oeste de São Paulo, os acidentes de trânsito caíram 38% nos locais onde foram implantadas ciclovias.
Mas, quando qualquer capital brasileira é comparada com algumas cidades europeias, o avanço da bicicleta enquanto meio estrutural de transporte parece não apenas modesto, mas francamente embrionário.
A seguir estão alguns exemplos do que está acontecendo em algumas cidades, principalmente no norte da Europa no que diz respeito às bikes e ciclovias.
HOLANDA – Sem dúvida, não há país mais adiantado no mundo neste quesito do que a Holanda – em 2017, a média era de 1,3 bicicletas por pessoa. Eram 17 milhões de bikes para 13 milhões de habitantes. A principal cidade do país, Amsterdam, tem, não por acaso, o apelido de “a cidade das bicicletas”.
De fato, a quantidade de ciclistas nesta cidade impressiona. Amsterdam tem uma população de pouco mais de 830 mil pessoas e nada menos do que 880 mil bikes, número quatro vezes maior do que o de carros.
Mais impressionante ainda: 58% dos moradores afirmam pedalar todo santo dia, para fazer todo tipo de coisa, ir ao trabalho, à escola, levar o cãozinho ao veterinário, tomar uma cerveja.
A topografia de Amsterdam – como de resto, de toda a Holanda, uma planura só – obviamente ajuda nesta opção. Sem falar que o centro histórico de Amsterdam, repleto de canais e ruas estreitas, torna bastante complicado o tráfego de veículos.
Diga-se que esta paixão de Amsterdam pela bicicleta não veio do nada. A prefeitura fez grandes investimentos para estimular o uso desse tipo de transporte, tendo iniciado a construção de ciclovias ainda na década de 1970.
Hoje, são mais de 760 km de vias exclusivas para bikes espalhadas pela cidade – uma delas, inclusive, iluminada por energia solar. Houve pesados investimentos também em bicicletários: perto da estação central de trem, há, por exemplo, um estacionamento para 10 mil bikes. As lojas de aluguel de bicicletas também estão um pouco por toda parte.
O resultado é que, nos últimos 20 anos, o uso da bicicleta em Amsterdam cresceu mais de 40%. E o estímulo governamental às bikes continua. A prefeitura da cidade anunciou em 2018 um investimento de 120 milhões de euros, até este ano de 2020, para melhorar ainda mais a infraestrutura para os ciclistas, incluindo a oferta de mais 38 mil vagas de estacionamento.
Utrecht, localizada a pouco mais de 50 km de Amsterdam, é outra cidade holandesa onde a preferência pela bicicleta é visível no dia a dia. Esta preferência é tamanha que a prefeitura montou, também perto da estação ferroviária central, um estacionamento capaz de abrigar, quando inteiramente concluído, 12,5 mil bikes.
Será simplesmente o maior estacionamento de bicicletas do mundo. A localização dele é facilmente explicável. Cerca de 40% dos usuários de trem de Utrecht chegam à estação, que é bastante movimentada, pedalando uma bike.
O assunto é levado tão a sério na Holanda, que até uma pequena cidade como Hague inaugurou recentemente um estacionamento para bicicletas gigantesco, capaz de abrigar 8,5 mil unidades.
DINAMARCA – Mas Amsterdam não é a cidade onde mais se usa bikes no continente. Esta posição é ocupada por Copenhague, capital da Dinamarca, onde 62% dos cidadãos usam a bicicleta diariamente para trabalhar ou estudar e apenas 9% dirigem carros. Na verdade, apenas 25% das pessoas que vivem em Copenhague têm automóvel.
Cidade como que implantada sobre o mar, Copenhague ganhou nos últimos anos 16 novas pontes para bicicletas e um sistema de semáforos inteligentes que prioriza ônibus e bicicletas. O ciclista lá é tão bem tratado que em 2017 a cidade ficou em primeiro lugar entre as 20 melhores cidades do mundo para andar de bicicleta.
Mas nem sempre foi assim. Copenhague era considerada, poucas décadas atrás, como a capital com um dos piores trânsitos da Europa. Mas uma política pública feita de investimentos em infraestrutura e de conscientização popular sobre os benefícios do transporte sustentável logrou, aos poucos, reverter este cenário.
O investimento no uso da bicicleta faz parte, aliás, de um plano da capital da Dinamarca de torná-la uma “cidade carbono neutro” até 2025. Do jeito que a coisa está indo bem, objetivo perfeitamente factível.
NORUEGA – Já na capital da vizinha Noruega, Oslo, outra cidade bem fornida de ciclistas e ciclovias, a prefeitura decidiu simplesmente disponibilizar para os moradores um subsídio de US$ 1.200 para que eles possam comprar bicicletas elétricas.
O valor equivale à metade do preço de uma e-bike modelo popular, e só pode ser usado na compra de e-bikes cargo, feitas para transportar pessoas e mercadorias. A intenção é induzir a população a não usar mais os carros para fazer compras no supermercado, por exemplo.
O governo norueguês, de seu lado, está investindo cerca de US$ 920 milhões na construção de dez estradas para bicicletas. As vias não estão sendo implantadas ao longo de estradas já existentes, mas construídas para uso específico pelos ciclistas.
Os engenheiros estimam que, quando prontas, as estradas permitirão que os ciclistas pedalem em uma velocidade de até 40 km por hora. A estimativa é de que, até 2030, de 10% a 20% de todas as jornadas feitas no país sejam feitas com as magrelas.
ALEMANHA – A Alemanha também está investindo em estradas para ciclistas. A Radschnellweg terá 100 km e conectará 10 cidades e quatro universidades localizadas na densamente industrializada região do Ruhr, no noroeste do país.
Com isso, o governo espera tirar 50 mil carros que trafegam pelas estradas diariamente e incentivar ainda mais pessoas a adotarem a bicicleta como meio de transporte. Com cerca de 4 m de largura, a estrada será iluminada à noite e, assim como as rodovias, contará com remoção de neve durante o inverno.
A localização da ciclovia – que na verdade será um complexo de ciclovias – foi planejada também de um ponto de vista logístico. Aproximadamente 2 milhões de alemães vivem até 1,5 km distantes da nova ciclovia. Para finalizar a construção desta autêntica rodovia para bicicletas, serão necessários cerca de US$ 200 milhões.
POLÔNIA – Uma ciclovia que brilha à noite – é a novidade que vem do norte da Polônia, nas imediações do município de Lidzbark Warminsk. Dotada de uma luz azul fluorescente, a ciclovia dá ao ciclista a sensação de que ele está pedalando entre as estrelas. A ciclovia foi desenvolvida pela empresa europeia TPA, especializada em geo-engenharia e tecnologias inovadoras em produtos para construção civil.
A iluminação da ciclovia funciona a partir da energia solar, ou mais especificamente, ela é gerada por partículas sintéticas chamadas de “luminophores”, que “carregam” o asfalto durante o dia.
DESIGN – Mas outras ciclovias da Europa também já dispõem de energia solar para finalidades tanto práticas como estéticas, como a Ciclovia Van Gogh, na Holanda, desenvolvida pelo escritório de design Daan Roosegaarde, e a “The Bicycle Snake”, em Copenhague, na Dinamarca, com seu trajeto curvilíneo e de estonteante cor vermelha.
Fora da Europa, em Auckland, na Nova Zelândia, foi implantada a “Light Path” (ou, percurso leve, solto), uma ciclovia cor de rosa, com desenhos maoris, os aborígenes locais, distribuídos ao longo do trajeto.
A via cumpre também um importante papel de organizador do tráfego. Ela passa por cima e ao lado de avenidas bastante movimentadas da cidade e, assim, consegue interligar diversos outros trechos de faixas para ciclistas. (texto: Alberto Mawakdiye)