Governo de São Paulo anuncia a criação de 11 polos de desenvolvimento
O governador de São Paulo, João Doria, anunciou, no último dia 22 de maio, que irá criar 11 polos de desenvolvimento econômico, com vista animar a debilitada indústria paulista e reduzir o nível de desemprego no estado, que hoje atinge 3,7 milhões de pessoas – o que equivale a quase 30% do total de desempregados no país.
Os polos serão beneficiados por regimes tributários especiais, financiamentos mais vantajosos, programas de qualificação de mão de obra, implantação de infraestrutura e estímulo à pesquisa e inovação. Serão ainda tomadas medidas destinadas a desburocratizar e melhorar o ambiente de negócios.
“Um governo responsável é comprometido com a geração de empregos. Mas não através de programas assistencialistas e muito menos com paternalismo. E sim incentivando o setor produtivo, criando condições adequadas para o setor privado produzir, gerar empregos, remunerar adequadamente, criando estabilidade e condições econômicas adequadas”,
(Governador João Doria, durante a cerimônia de lançamento do programa).
Cada um dos polos de desenvolvimento será ancorado em um setor da indústria e, em conjunto, cobrirão todas as regiões do estado.
Os 11 setores representam 75% da indústria da transformação paulista: máquinas e equipamentos e metalúrgico; automotivo; alta tecnologia; químico, borracha e plástico; saúde e fármacos; derivados de petróleo e petroquímico; biocombustíveis; alimentos e bebidas; têxtil, vestuário e acessórios; couro e calçados; e tecnologia e eco-florestal.
Os polos não serão geograficamente confinados, mas se espalharão pelas regiões que já concentram empresas ligadas aos setores que se pretende desenvolver.
Assim, o de máquinas e equipamentos e metalúrgico, por exemplo, se distribuirão pela Capital, Ribeirão Preto, Piracicaba, Sorocaba e as regiões do Alto Tietê, Vale do Paraíba e Central. Já o automotivo se espalhará por São Paulo e Região Metropolitana, ABC, Sorocaba, Campinas, Piracicaba, Alto Tietê e Vale do Paraíba.
A lista completa é a seguinte:
1. Agritech, Aeroespacial e Serviços Tecnológicos: Campinas, Piracicaba, Ribeirão Preto;
2. Alimentos e Bebidas: Marília, Bauru, São Carlos, Barretos, São Paulo e Região Metropolitana, Piracicaba, Campinas;
3. Automotivo: Sorocaba, Campinas, Piracicaba, ABC, Alto Tietê, São Paulo e Região Metropolitana, Vale do Paraíba;
4. Biocombustíveis: Barretos, São José do Rio Preto, Araçatuba, Presidente Prudente;
5. Couro e Calçados: Franca, Bauru, Araçatuba;
6. Derivados de Petróleo e Petroquímico: Baixada Santista, Piracicaba, Bauru, São Paulo, Alto Tietê, Vale do Paraíba;
7. Eco-Florestal: Vale do Ribeira;
8. Metal-metalúrgico e Máquinas e Equipamentos: Ribeirão Preto, Central, Piracicaba, Sorocaba, São Paulo, Alto Tietê, Vale do Paraíba;
9. Químico, Borracha e Plástico: Baixada Santista, São Paulo e Região Metropolitana, Campinas, ABC, Alto Tietê, Vale do Paraíba;
10. Saúde e Farma: Ribeirão Preto, Campinas, São Paulo e Região Metropolitana, Alto Tietê;
11. Têxtil, Vestuário e Acessórios: São Carlos, Itapetininga, Sorocaba, São Paulo e Região Metropolitana, Vale do Paraíba.
“A atuação dos polos será no sentido de identificar falhas de mercado e atuar nas falhas de governo. O nosso trabalho será de alavancar a produtividade do setor privado impulsionando e melhorando as políticas públicas nas regiões onde as cadeias produtivas estão”.
(Patricia Ellen, secretária de Desenvolvimento Econômico).
O programa – que na prática não deixa de ser uma política industrial – vai, curiosamente, na contramão da equipe econômica federal, que é contrária a qualquer tipo de incentivo fiscal ao setor produtivo.
A adoção de políticas industriais foi, inclusive, uma marca dos governos petistas nas gestões Lula e Dilma – notórios adversários políticos de Doria -, e que sofreu críticas severas por apresentar gastos fiscais excessivos e poucos resultados.
Na verdade, em março, o governador já havia concedido incentivos fiscais a montadoras que fizerem novos investimentos no estado, como descontos de até 25% no valor do ICMS para empresas que apresentarem planos de construção ou ampliação de plantas industriais em valores superiores a R$ 1 bilhão. Para se beneficiarem das reduções tributárias, as companhias deverão gerar pelo menos 400 novos postos de trabalho. Há, portanto, um precedente neste próprio governo.
A equipe de Doria, no entanto, afirma que a inspiração do programa dos polos industriais vem de experiências liberais semelhantes com zonas econômicas especiais nos EUA, Grã-Bretanha, Israel e Coreia do Sul. E que de forma alguma se trata de declaração de uma “guerra fiscal” contra os outros estados da Federação.
“Haverá, sim, uma redução de ICMS de 2,5%, por exemplo, caso haja investimentos e criação de empregos. Mas não se trata de incentivo ou renúncia fiscal, já que, pelo contrário, com os investimentos a arrecadação aumentará. E também não haverá acréscimo de recursos no orçamento do estado para o programa. Vamos fazer com o que temos”.
(Henrique Meirelles, secretário da Fazenda, Henrique Meirelles).
Alguma coisa, de fato, precisava ser feita para tirar o estado de São Paulo, o mais industrializado do país, do processo de desindustrialização a que ele está submetido como todo o Brasil, só que em escala evidentemente maior, por concentrar boa parte das indústrias.
O quadro da desindustrialização no país chega a ser aterrador. De acordo com uma pesquisa do IBGE, nada menos do que 13,8 mil indústrias fecharam no Brasil em três anos, devido aos efeitos da crise econômica e da falta de políticas públicas eficientes para o setor. Além disso, entre 2013 e 2016, os investimentos no setor industrial sofreram uma queda de 23,85%.
Segundo o levantamento, havia 321,2 mil indústrias ativas em 2016 no país, 4,1% a menos que em 2013, antes da crise, quando o número de empresas do setor industrial era de 335 mil. O fechamento das empresas foi mais acentuado entre 2014 e 2015, quando 10,5 mil indústrias fecharam as portas. De acordo com o IBGE, as indústrias de transformação representam quase a totalidade das empresas do setor – as extrativas correspondem a cerca de 2% do total de indústrias no país.
Ainda segundo a pesquisa, entre 2013 e 2016 os investimentos no setor industrial sofreram uma queda de 23,8%. Em 2013 os investimentos somaram R$ 244 bilhões, e em 2016 totalizaram R$ 185,9 bilhões. Outra consequência do fechamento das empresas foi a redução de 1,3 milhão no número de postos de trabalho do setor industrial brasileiro. Em 2013, eram 9 milhões de empregados na indústria e em 2016 o total de empregados era de 7,7 milhões – uma queda de 14,25%.
São Paulo, sem dúvida, é o estado que mais tem se ressentido desse virtual desmanche. Em 2016, o estado com maior valor adicionado da indústria de transformação foi São Paulo, com R$ 260,5 bilhões. Este valor correspondeu a 38,5% do valor adicionado da indústria de transformação brasileira. Em 2017, São Paulo era o estado com maior participação no número de estabelecimentos da indústria de transformação, com 26,3%.
O processo de desindustrialização paulista, de qualquer modo, já vem de longe. Durante o período de 1985 a 2017, o número de pessoas empregadas na indústria de transformação paulista diminuiu sua participação em relação aos outros setores da economia, registrando, em 2017, a menor participação dentro deste período.
O segmento, que, em São Paulo, chegou a deter 39,0% dos empregos formais da economia paulista em 1986, sofreu uma queda de nada menos do que 21,3 pontos percentuais, chegando a uma participação de 17,7% em 2017.
Ainda amargou grande perda de participação em relação ao número de estabelecimentos para os outros setores da economia durante o período de 1986 a 2017. A indústria de transformação, que chegou a deter 17,6% dos estabelecimentos paulistas em 1986, passou a responder por apenas 9,8% em 2017.
“A iniciativa do governo paulista é positiva. Identifica gargalos e busca como dissolvê-los. Mas talvez não solucione o problema. Por causa da precária situação fiscal do país, faltam instrumentos para uma política industrial efetiva”.
(David Kupfer, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – e especialista em política industrial).
É esperar para ver. (texto: Alberto Mawakdiye)