Guerra na Ucrânia faz aumentar a pressão inflacionária sobre a indústria brasileira
A pressão inflacionária é o principal impacto inicial causado pela guerra entre Rússia e Ucrânia para a indústria brasileira segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI). A alta dos preços internacionais das commodities agrícolas, minerais e energéticas resultante do conflito produz pressão adicional sobre a inflação mundial e a brasileira, ambas já afetadas pela pandemia. Isso poderá acarretar altas nas taxas de juros internacionais e no país, com efeitos negativos para a economia brasileira.
Os preços no mercado futuro, em dólares, aumentaram para uma série de commodities desde o dia de início da guerra. Alguns exemplos de altas entre 23 de fevereiro e 8 de março são: trigo (+45,3%); petróleo (+34,3%); paládio (+21,7%); milho (10,3%); açúcar (+4,9%); e alumínio (+4,2%).
O gerente executivo de Economia da CNI, Mário Sérgio Telles, ressalta que a dimensão dos impactos do conflito na economia brasileira depende da duração da guerra. “Uma duração mais longa poderá ampliar não só os efeitos sobre commodities, mas também os impactos negativos sobre o crescimento da economia mundial, influenciando as exportações brasileiras como um todo”, afirma.
No caso do Brasil, a elevação dos preços das commodities minerais (excluindo petróleo) e agrícolas deve ter efeitos mais imediatos sobre a inflação. A alta do petróleo impacta não apenas nos preços de combustíveis (gasolina e diesel), mas, também, em produtos petroquímicos, como plásticos e embalagens.
Devido à situação econômica do Brasil, a indústria não deve conseguir repassar integralmente essa alta em um primeiro momento, o que pode afetar a saúde financeira das empresas, na avaliação de Mário Sérgio. “Há um desemprego elevado no mercado interno que dificulta o repasse de preços na mesma proporção do aumento de custo. Com isso, pode haver uma redução da margem de lucro das empresas ainda afetadas pela crise, o que aumenta o risco de falências e de dificuldades em negociar dívidas”, afirma.
CADEIAS GLOBAIS – O conflito também poderá levar à escassez de componentes necessários à fabricação de chips e semicondutores, uma vez que a Rússia e a Ucrânia são grandes produtores globais de metais usados como componentes desses produtos. Também há a expectativa de novas elevações nos preços de frete internacional, agravando os problemas na logística das cadeias globais de suprimentos.
O descompasso das cadeias globais deverá repercutir no longo prazo, de acordo com o superintendente de desenvolvimento industrial da CNI, Renato da Fonseca.
“Quando você reabre os fluxos de suprimentos, a reorganização da logística de transportes ocorre aos poucos. Vai haver um impacto de mais longo prazo nesse sentido, até os mercados se regularizarem e essa desorganização é transmitida via preço. A redução desses preços vai acontecer à medida que os fornecedores consigam entrar novamente no ritmo de produção e distribuição para os compradores”, afirma.
COMÉRCIO – O fluxo de comércio entre Brasil e Ucrânia é pequeno, razão pela qual os efeitos diretos do conflito via relações de importações e exportações devem surtir efeitos pontuais sobre setores específicos. As consequências serão maiores no comércio com a Rússia. Em 2021, o país ocupou a 6ª posição dentre os principais importadores do Brasil, com um total de US$ 5,70 bilhões (2,6% das importações brasileiras). Com relação às exportações, a Rússia foi o 36º maior parceiro comercial do Brasil, contabilizando um total de US$1,59 bilhões (0,6% das exportações brasileiras).
Dentre os principais produtos que o Brasil importa da Rússia, destacam-se: produtos químicos (principalmente fertilizantes); óleos leves de petróleo; carvão mineral (hulha betuminosa e hulha antracita); e metalurgia (alumínio e paládio). “Como o Brasil importa principalmente fertilizantes agrícolas, o acesso mais restrito a esses insumos poderá impactar as próximas safras”, avalia Fonseca. Para alguns dos produtos importados, como metais básicos e de produtos químicos, existem possíveis substitutos no curto prazo para evitar a indisponibilidade de certos bens, ainda que os preços praticados sejam mais altos.
Do lado das exportações, as vendas brasileiras para Rússia são concentradas em: produtos agrícolas (soja, café), da indústria alimentícia (carne, açúcar), máquinas e equipamentos agrícolas e metalurgia (ferronióbio), de modo que os exportadores possivelmente precisarão realocar essas vendas. Entre os manufaturados, 10,5% dos tratores e 11,6% dos aparelhos usados para pulverizar líquidos ou pós exportados pelo Brasil nos últimos 5 anos foram para Rússia. Outros 6,5% das vendas brasileiras desses aparelhos entre 2017 e 2021 foram para Ucrânia.